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No contexto da agricultura familiar no semiárido brasileiro, o preparo do solo é uma etapa crítica que influencia diretamente a sustentabilidade dos sistemas produtivos. Diante da escassez hídrica, da baixa fertilidade natural dos solos e das limitações socioeconômicas, diferentes métodos têm sido adotados e adaptados com base em pesquisas agroecológicas e práticas tradicionais reconfiguradas.
Um dos métodos mais difundidos historicamente é a derruba e queima, prática tradicional que envolve a brocagem, corte, secagem e queima da vegetação para limpeza da área. Apesar de sua simplicidade e baixo custo, a técnica tem sido apontada como insustentável, pois acarreta perdas de nutrientes, redução da biodiversidade e aceleração da degradação do solo. Alternativas vêm sendo experimentadas por agricultores em transição agroecológica, como a “roça sem queima”, que mantém a matéria orgânica no solo e incorpora adubação orgânica para recuperar a fertilidade, embora exija maior esforço físico e organização comunitária (MOTA et al., 2017).
O roço manual é uma prática de menor impacto ambiental, utilizada para limpar o terreno por meio da retirada seletiva de arbustos e vegetação rasteira, com preservação de árvores nativas. Segundo Melo et al. (2019), o método é recomendado em áreas sensíveis ou onde se pretende preservar a estrutura do solo e a cobertura vegetal, reduzindo o risco de erosão.
Por outro lado, o preparo mecanizado é amplamente utilizado em áreas maiores, com o uso de tratores, arados e subsoladores. Apesar da eficiência operacional, esse método pode comprometer a estrutura do solo quando mal executado, promovendo a compactação e a perda de matéria orgânica. A Embrapa orienta que a mecanização seja acompanhada de práticas de conservação do solo, como o uso de curvas de nível, gradagem leve e correção da acidez com calcário incorporado de forma homogênea (ANJOS, 2009).
Como alternativa sustentável, destaca-se a capina seletiva, que consiste na remoção apenas das espécies vegetais indesejadas, mantendo espécies úteis ou nativas, o que favorece o controle biológico e a diversidade. Essa prática é coerente com os princípios da agroecologia e tem sido adotada em áreas de transição ecológica para preservar o solo e otimizar recursos (MELO et al., 2019).
Por fim, os Sistemas Agroflorestais (SAFs) têm se mostrado altamente promissores no semiárido. Eles integram o cultivo de árvores nativas, frutíferas, forrageiras e espécies agrícolas, promovendo a resiliência dos agroecossistemas frente às adversidades climáticas. Além de sequestrar carbono e melhorar a fertilidade do solo, os SAFs apresentam boa produtividade, conforme demonstrado em experimentos no norte da Bahia com consórcios de acerola, caju, goiaba e forrageiras como leucena e gliricídia (COSTA NETO et al., 2023).
Essas abordagens mostram que o preparo da terra no semiárido deve ser orientado por critérios técnicos e ambientais, respeitando os saberes locais e adotando práticas que promovam a conservação dos recursos naturais e a segurança alimentar das famílias agricultoras.
REFERÊNCIAS
MELO, Roseli Freire de; GIONGO, Vanderlise; DEON, Diana Signor; ANJOS, José Barbosa dos. Uso e manejo do solo. In: MELO, Roseli Freire de; VOLTOLINI, Tadeu Vinhas (orgs.). Agricultura familiar dependente de chuva no Semiárido. Brasília, DF: Embrapa, 2019. p. 395-442. Disponível em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1114220/1/Agriculturafamiliardependentedechuvanosemiarido2019.pdf. Acesso em: 1 jan. 2025.
COSTA NETO, Benjamim Pereira; MARTIN, Dannielle Roseanne Pereira Santos; OLIVEIRA, Adrieli da Foncêca. Crescimento preliminar de espécies frutíferas e forrageiras em consórcio agroflorestal em solo semiárido. Revista de Agroecologia no Semiárido, v. 7, n. 2, p. 14-23, 2023. Disponível em: https://periodicos.ifpb.edu.br/index.php/ras/article/view/7465/pdf22. Acesso em: 10 fev. 2025.
MOTA, Nashira Remígio; MOTA, Dalva Maria; MOTA, Narciso Ferreira. Transição agroecológica do roçado tradicional para a roça sem queima: mudanças no preparo da terra. Revista Brasileira de Agroecologia, v. 12, n. 2, p. 117-125, 2017. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/rbagroecologia/article/view/50031/38030. Acesso em: 21 jan. 2025.
ANJOS, José Barbosa dos. Mecanização agrícola, manejo e conservação de solo. In: EMBRAPA Semi-Árido. A Viticultura no Semi-Árido Brasileiro. Petrolina: Embrapa Semi-Árido, 10, p. 259-273. Disponível em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/134244/1/AViticulturanoSemiAridopag259273.pdf. Acesso em: 21 jan. 2025.